segunda-feira, 26 de abril de 2010

Permissão para voar

De olhos fechados é permitido chegar a qualquer lugar. Era assim que ela se permitia, e permanecia com os olhos bem fechados, as coisas poderiam parar ou caminhar infinitamente mais rápidas que não tinha importância alguma. No ar do quarto pairava um morno cheiro de café fresco, Durante aqueles incalculáveis tempos ela simplesmente era como os fios de lã em uma cesta que nunca poderiam voltar ao novelo, condenados para sempre naquela confusão sem começo ou fim. De dentro do seu labirinto ela podia quase se sentir feliz, em casa talvez.

Lá fora ventava suave a brisa de uma manhã qualquer de primavera, os pássaros cantavam em burburinho, o céu provavelmente estava naquela imensidão azul, as flores dos laranjais perfumando, enfeitando o quadro perfeito que em outros tempos poderia até ser real, mas que naqueles dias não passava de uma imagem perdida na mente de alguém que não sabia sequer o próprio nome e que há muito tempo não limpava sua própria baba.

As horas param, os dias passam e voltam, anos rastejam em segundos eternos de tic-tac tão duros como o martelo de um juiz pedindo atenção. Um grande buraco se abre. Um vácuo cerebral tão dolorido quanto pode ser lateja. Dois olhos reacendem. Um homem de branco no canto do quarto arruma algumas coisas não visíveis, o café já meio velho na bandeja permanece intocado, sabe-se lá por quanto tempo. Os braços amarrados não alcançam nem mesmo seu próprio rosto, quem dirá aquela bandeja metálica, tão fria quanto a morte, quanto a falta de sonhos e a sobra de vida guardada dentro de quatro paredes. A sua volta a realidade de um quarto enlouquecedoramente branco, o vazio destruidor de imagens, mas nada dura.

O espaço de tempo que estivera ali e ali permaneceria já não faziam qualquer diferença... a névoa da loucura fechando novamente sobre seus olhos. Silêncio e sonhos.